29 dezembro 2008

Contemplação e experiência de paz

“ A verdadeira contemplação é obra de um amor que transcende toda satisfação e toda experiência para repousar na noite da fé pura e nua. Essa fé nos leva para tão perto de Deus que se poderia dizer que o toca e percebe, tal como Ele é, embora na escuridão. E o efeito de um contato assim muitas vezes é uma profunda paz que extravasa sobre as faculdades inferiores da alma, constituindo, assim, uma ‘experiência’. Mas essa experiência ou sentimento de paz continua sempre sendo um acidente da contemplação, de maneira que a ausência dessa ‘sensação’ não significa que nosso contato com Deus tenha cessado.”


New Seeds of Contemplation
, de Thomas Merton

(New Directions, New York), 1961. p. 211
No Brasil: Novas Sementes de Contemplação, (Editora Fissus, Rio de Janeiro), 2001. p. 208

Reflexão da semana de 29-12-2008

Um pensamento para reflexão: “Jamais teremos perfeita paz interior e recolhimento se não estivermos desapegados até mesmo do desejo de paz e recolhimento. Jamais oraremos perfeitamente enquanto não estivermos desapegados dos prazeres da oração.”
Novas sementes de contemplação, Thomas Merton

22 dezembro 2008

O mistério do Natal, 2008

“ O Mistério do Natal nos impõe uma dívida e uma obrigação para com o resto da humanidade e para com todo o universo criado. Nós que vimos a luz de Cristo somos obrigados, pela grandeza da graça que nos foi dada, a tornar conhecida a presença do Salvador até os confins da terra. Isso faremos não só pregando a boa-nova de sua vinda, mas, sobretudo, revelando-O em nossas vidas. Cristo nasceu para nós hoje para que pudesse aparecer ao mundo todo por nosso intermédio.”
Seasons of Celebration, de Thomas Merton
(Farrar, Straus and Giroux, New York), 1965. p. 112
No Brasil: Tempo e Liturgia, (Editora Vozes, Petrópolis), 1968. p. 115
Reflexão da semana de 22-12-2008


Um pensamento para o Natal: “Este dia é o do seu nascimento, mas todos os dias de nossa vida mortal devem ser sua manifestação, sua divina Epifania no mundo que Ele criou e redimiu.”
Tempo e Liturgia, Thomas Merton

15 dezembro 2008

Amor é meu nome

“ Dizer que fui criado à imagem de Deus é dizer que o amor é a razão de minha existência, pois Deus é amor. Amor é a minha verdadeira identidade. Esquecimento de mim mesmo é meu verdadeiro eu. Amor é meu verdadeiro caráter. Amor é meu nome.”

New Seeds of Contemplation, de Thomas Merton
(New Directions, New York), 1962. p.60
No Brasil: Novas Sementes de Contemplação (Editora Fissus, Rio de Janeiro). 2001. p.66

Reflexão da semana de 15-12-2008

Um pensamento para reflexão: “Para encontrar o amor, tenho de penetrar no Santuário onde ele está oculto, santuário que é o mistério de Deus.”
Novas Sementes de Contemplação, Thomas Merton

10 dezembro 2008

Silêncio e a arte do poeta

Artigo de Frederick Smock* para o The Courier-Journal, de Louisville, Kentucky

Por ocasião do 40º aniversário da morte de Thomas Merton, quero pensar sobre o silêncio. Sem dúvida, Merton fez voto de silêncio, e foi ocasionalmente silenciado pelo Vaticano. Mas não estou pensando nessas formas de silêncio. Quero, antes, pensar sobre o silêncio e a arte do poeta.

Boa parte da vida do monge é passada em silêncio. Boa parte da vida do poeta também transcorre em silêncio – o poeta só passa uma fração de sua vida escrevendo poemas. Merton era tanto monge como poeta, e, assim, conhecia bem o silêncio. A exemplo da meditação e da oração, a poesia é rodeada de silêncio. A poesia começa e termina em silêncio. O silêncio também é inerente ao poema, como os silêncios entre as notas na música. Como disse um grande poeta chinês, Yang Wan-li, mil anos atrás, “O poema é feito de palavras, sim, mas, tirando as palavras, o poema permanecerá”.

Contudo, quando pensamos em silêncio, não necessariamente pensamos em Merton. Ele foi um homem loquaz e um escritor prolífico. Continua a publicar postumamente. Sempre parece estar falando conosco. As prateleiras rangem sob o peso de sua obra que se acumula. No final da vida, contudo, Merton lamentou o fato de ter escrito tantos editoriais, e não mais poemas e orações – formas que participam do silêncio. “Vejo cada vez mais a necessidade de abandonar minha própria ‘carreira’ absurda de jornalista religioso”, escreveu em seu diário (2 de dezembro de 1959). “Parar de escrever para publicação – exceto poemas e meditações criativas.”

“O que realmente quero fazer?”, perguntou-se Merton em seu diário (21 de junho de 1959). “Longas horas de tranqüilidade no bosque, lendo um pouco, meditando muito, subindo e descendo descalço pelo chão coberto de agulhas de pinheiro.” O que alguém confia a seu diário é, ao mesmo tempo, a versão mais reservada e mais autêntica de si mesmo. Os livros escritos para consumo público não são enganosos, apenas não vêm do mais profundo sentimento. Na festa de Santo Tomás de Aquino, (7 de março de 1961), Merton escreveu em seu diário: “determinado a escrever menos, a desaparecer gradualmente.” Acrescentou, no final dessa anotação, que “a última coisa que desistirei de escrever serão este diário, cadernos e poemas. Mais nenhum livro piedoso.”

A vida é uma jornada em direção ao silêncio, e não só o silêncio da morte. Os jovens falam muito – são barulhentos. Os idosos são reticentes. Afinal, há tanto a ponderar. Os mais velhos tendem a segurar a língua. Conhecem a sabedoria que há em conter-se. O fato de ter visto muitas coisas leva a reservar o julgamento. Nesta era moderna, quando o noticiário e a política são dominados por rostos que falam sem parar, o silêncio se torna um bem precioso. A mera ausência de fala já soa como silêncio. Mas o verdadeiro silêncio é uma presença, não uma ausência. Uma plenitude. Uma riqueza cujo valor depende da pureza da intenção, não apenas da falta de distrações.

Em anotação posterior em seu diário (4 de dezembro de 1968), Merton escreveu sobre a visita às grandiosas estupas de Buda e Ananda em Gil Vihara, Sri Lanka. “O silêncio dos rostos extraordinários. Os estupendos sorrisos. Imensos, e, no entanto, sutis. Cheios de toda possibilidade, questionando nada, sabendo tudo, rejeitando nada…” Ao falar da figura de Ananda, Merton conclui: “Diz tudo. Não precisa de nada. Como não precisa de nada, pode ser silenciosa, despercebida, não descoberta.” Ele também fotografou essas estátuas, focalizando-se em sua serenidade beatífica.

Quando estamos silenciosos, podemos ouvir o vento nas árvores e a água no arroio; isso não é mais eloqüente do que qualquer coisa que possamos ter a dizer? A respeito da vida no eremitério recém construído, Merton escreve em seu diário (24 de fevereiro de 1965): “Não posso imaginar outra alegria na terra além de ter um lugar assim e ali estar em paz, viver em silêncio, pensar e escrever, ouvir o vento e todas as vozes do bosque, viver à sombra da grande cruz de cedro, preparar-me para a morte...”

É irônico um escritor enaltecer o silêncio? Não mais, talvez , do que elogiar a ignorância, que é o que Wendell Berry faz em seu poema “Manifesto: A Frente de Libertação do Agricultor Louco.” Berry escreve: “Viva a ignorância, pois o que o homem não encontrou, também não destruiu.” Então, talvez devamos enaltecer o silêncio, pois o que o homem não disse, não mentiu.

O louvor ao silêncio perpassa as meditações de Merton. Só um exemplo: A respeito de seu ensino aos noviços em Gethsemani, escreveu (04 de julho de 1952) que “entre o silêncio de Deus e o silêncio de minha alma ergue-se o silêncio das almas a mim confiadas.”

Sem dúvida, desde sua morte, Merton tem estado em silêncio – se não silenciado. Também há o suave sussurro, no limiar ao audível, de poemas e orações que ele não viveu para escrever.

*Frederick Smock é diretor do Departamento de Inglês da Universidade Bellarmine. Seu livro mais recente é Pax Intrantibus: A meditation on the Poetry of Thomas Merton (Broadstone Books).

Uma carta sobre a morte de Thomas Merton

Escrita por Pe. Mathew Kelty, OCSO*


Sepultamos Padre Louis [Thomas Merton] ontem atrás da igreja do mosteiro em uma encosta sob um cedro, de onde se tem uma vista ampla das montanhas cobertas de bosques que ele amava. Estranho, pois só ao escrever isto percebi que ele tinha mesmo de ser sepultado lá, onde não há muros obstruindo a vista. A parte do cemitério cercada pelo muro logo atrás da igreja está cheia há alguns anos. Padre Louis está em um lugar aberto de onde se pode ver a beleza do campo ao redor. Combina.

O funeral foi às 15h30 e começou pontualmente. Já estava quase escuro quando chegou o momento de o colocarmos na terra, e caíam umas poucas gotas de chuva. Estava úmido e o frio era em torno de 1º abaixo de zero, diria eu.

O rito foi alegre – nenhuma outra palavra serviria. Havia cerca de quarenta concelebrantes e o arcebispo estava presente, mas não quis ser um deles. Disse que era algo nosso. Na nave, um bom número de pessoas, convidadas, representantes dos mundos em que Padre Louis atuava: escritores, poetas, artistas, pacifistas, freiras, padres, editores, pessoas comuns.

Ele faleceu longe, em meio à preocupação com a vida monástica no Oriente. Sua morte foi confusa; quero dizer, não temos total certeza do que ele morreu: enfarto, acidente com o ventilador elétrico? Mas nos basta o veredicto de que a morte foi acidental. Na confusão inicial, falou-se em fazer uma autópsia. Imagine tentar providenciar algo assim pelo telefone com Bangkok. Isto atrasou seu retorno. Houve demoras frustrantes, e ele chegou aqui bem na hora de seu funeral. O caixão não foi aberto, de forma que tive mesmo razão quando, ao vê-lo partir, pensei: “Nunca mais o veremos.”

Padre John Eudes, nosso próprio médico, olhou-o em Louisville. Que eu saiba, Padre Louis é o único sepultado em um caixão em nosso cemitério, o que combina bem com ele! O caixão era um desses monstros típicos que você tem a impressão de terem saído dos estúdios da Metro-Goldwyn-Mayer. As leituras do Livro de Jonas na Missa foram apropriadas. Diante de nós estava a baleia com Padre Louis dentro.

Padre Dan Walsh, seu primeiro laço com Gethsemani, fez uma boa homilia, sóbria e digna. Tudo correu bem e foi rico em coisas significativas para nós. Enquanto os padres tiravam os paramentos para o enterro, ouviu-se um interlúdio de Mozart que assentou bem no coração.

Não sei como resumir aquele homem; essa idéia nem vem ao caso. Salvo para dizer que ele era uma contradição. Viveu no centro da cruz, onde os dois braços se encontram. Talvez , poderíamos dizer, no coração da vida. Imagino que em nenhum outro lugar a contradição é reconciliada.

Ele era um problema para muitos aqui e em outros lugares. Sei qual é a razão do problema: quero dizer, as tensões aterrorizantes que aquele homem suportou com um tipo de coragem que só o poder de Deus possibilitava. Quando eu estava ao lado dele, sempre sentia que Deus estava perto. E estar perto de Deus é estar perto de algo ao mesmo tempo maravilhoso e terrível. Como o fogo. Queima. As pessoas ficavam sempre tentando sair do lugar que ele criava (simplesmente sendo o que era) para elas encaixando-o em uma ou outra categoria e fazendo com que ele ficasse ali. Dava tão certo como engarrafar neblina! Decidiam que ele era “monge” e o que o monge deveria fazer. Então esperavam que ele o fizesse. Mas ele não fazia. Não podia.

Quando se tornou eremita, decidiam o que é eremita e então viam se ele estava sendo um bom eremita. E ele não estava! A única maneira como eu conseguia viver com ele era amando-o como um todo, como ele era, com todas as suas contradições, e acho que esta é a única maneira de entendê-lo. Esta era a maneira como ele me amava.

Nunca conheci homem mais alegre, mas com tristezas profundas de que era melhor nem falar. Amava a vida monástica, mas a vivia conforme um estilo todo próprio. Tinha um real amor pela vida solitária, mas ninguém aqui tem o amor que ele tinha pelas pessoas, pelo mundo que Deus fez.

Estava acima de tudo que era trivial e miúdo, mas se mantinha a par de tudo e sabia tudo o que estava acontecendo. Podia ser duro como qualquer pessoa, mas era suave e terno como uma criança com um passarinho. Podia ser loquaz e leve, mas também congelar você com sua intensidade e ardor. Seu andar era lépido como o de um homem de vinte anos, mas não conheço muitos que tenham seu senso de compaixão. Amava o mosteiro, mas era crítico de suas fraquezas e tolices. Discutia e argumentava com seu abade assim como um advogado astuto defende uma causa perdida, mas era obediente até o cerne de seu ser. Sua obediência foi testada várias e diversas vezes, e encontrada pura.

Não consigo continuar. Não se recebe com freqüência esse tipo de pessoa das mãos de Deus. Ele é uma testemunha viva de Deus, de Gethsemani, da vida monástica, da Igreja, do mundo. Louvado seja Deus em seus santos agora e para sempre. Amém.

* Monge de Gethsemani, noviço de Thomas Merton e seu confessor nos últimos anos de sua vida.

08 dezembro 2008

Perdoei o universo sem-fim

A data de 10 de dezembro de 2008 marcará o quadragésimo aniversário da morte de Merton e o 67º aniversario do seu ingresso na vida monástica na Abadia de Gethsemani.

[A Voz de Deus foi ouvida no Paraíso:]
“ Sempre protegi Jonas com Minha misericórdia, e não sei absolutamente o que é a crueldade. Viste-me alguma vez, Jonas, filho meu? Misericórdia dentro de misericórdia dentro de misericórdia. Perdoei o universo sem-fim, porque nunca conheci o pecado.

O que era pobre tornou-se infinito. O que é infinito nunca foi pobre. Sempre considerei a pobreza como infinita: não amo absolutamente as riquezas. Prisões dentro de prisões dentro de prisões. Não construais para vós êxtases sobre a terra, onde tempo e espaço corrompem, onde os minutos invadem e furtam. Não te prendas mais ao tempo, Jonas, filho meu, para que os rios não te carreguem.

O que era frágil tornou-se poderoso. Amei o que era mais frágil. Olhei para o que nada era. Toquei o que era sem substância e, dentro do que não era, sou.”

The Sign of Jonas, de Thomas Merton
(Harcourt, Brace and Company, New York), 1953 p. 362
No Brasil: O Signo de Jonas, (Editora Mérito, São Paulo - Rio de Janeiro), 1954, p. 409-410
Reflexão da semana de 08-12-2008

Um pensamento para reflexão*: “ Senhora, quando naquela noite deixei a Ilha que outrora foi tua Inglaterra, teu amor veio comigo, embora eu não soubesse nem conseguisse me dar conta disso. E era teu amor, tua intercessão por mim, perante Deus, que estava aplacando os mares diante do navio, abrindo meu caminho para outro país.

Eu não sabia ao certo para onde ia, nem podia prever o que faria quando chegasse a Nova York. Mas vias mais longe e mais claro do que eu, e abriste os mares diante do meu navio, cujo trajeto levou-me, cortando as águas, a um lugar com o qual eu jamais sonhara e que, todavia, já estavas preparando para ser minha salvação, meu abrigo, meu lar. Enquanto eu achava que não havia Deus, nem amor, nem misericórdia, me conduzias o tempo todo para o meio do Seu amor e da sua misericórdia e, sem que eu nada soubesse, me levavas para a casa que me ocultaria no segredo da Sua Face.”

A Montanha dos Sete Patamares, Thomas Merton

*Um trecho de uma oração de Merton à Mãe de Deus na data da solenidade de sua Imaculada Conceição, rememorando sua partida da Inglaterra, pela última vez, para viver nos Estados Unidos, estudar na Universidade de Columbia, até encontrar um "lar" na Abadia de Gethsemani.

01 dezembro 2008

Puritas cordis

Puritas cordis [pureza de coração] significa muito mais do que perfeição moral ou mesmo ascética. É o fim de um longo processo espiritual de transformação no qual a alma, perfeita na caridade, desapegada de toda criatura, livre de todos movimentos das paixões desordenadas, é capaz de viver mergulhada em Deus, sendo penetrada, de quando em vez, por intuições vivas de Sua ação, intuições que sondam as profundezas dos mistérios divinos, que ‘entendem’ Deus em uma íntima e secreta experiência, não só de quem Ele é, como do que está fazendo no mundo. A pessoa pura de coração não só conhece a Deus, Ser Absoluto, Ato puro, mas o reconhece como Pai das Luzes, Pai das Misericórdias, que tanto amou o mundo que lhe deu Seu Filho Unigênito para o remir. Essa pessoa O conhece não apenas pela fé, pela especulação teológica, mas por uma íntima e incomunicável experiência.”

Bread in the Wilderness, de Thomas Merton
(New Directions Publishing Corp. New York), 1953 p. 20-21
No Brasil: O Pão no Deserto, (Ed. Vozes, Petrópolis), 1963, p. 33
Reflexão da semana de 01-12-2008


Um pensamento para reflexão
: “A contemplação nos será concedida quando a revelação, que é dada a toda a Igreja nessas palavras inspiradas [dos Salmos], se abrir de repente e se tornar uma experiência pessoal, uma luz mística profunda e transformadora que penetra e absorve todo o nosso ser.”

O Pão no Deserto, Thomas Merton

24 novembro 2008

Isso me basta!

“ Tudo neste meu eremitério enche-me de alegria. Há muitas coisas que poderiam ser mais perfeitas, de uma forma ou outra – esteticamente ou ‘domesticamente’. Mas este é o lugar que Deus me concedeu após muitas orações e muita expectativa – sem que eu o mereça. É um encanto. Não consigo imaginar mais júbilo na terra do que ter este lugar e nele viver em paz, em silêncio, para refletir e escrever, para ouvir o vento e todas as vozes do bosque, vivendo à sombra da grande cruz de cedro, preparando-me para minha morte e meu êxodo para a pátria celeste, para amar meus irmãos e toda humanidade, para rezar pelo mundo, pela paz e pelo bom senso entre os homens. Assim, é este o ‘meu lugar’ no mundo de hoje. E isso me basta!”

Dancing in the Water of Life, de Thomas Merton.
Editado por Robert E. Daggy
(HarperSanFrancisco, San Francisco), 1997 p. 209
Reflexão da semana de 24-11-2008

Um pensamento para reflexão: “A maior e única coisa é adorar e louvar Deus. É buscá-lo para adorá-lo e dizer-lhe que somente ele é Deus e ninguém mais. Devemos entregar nossa vida por sua Verdade. Devemos dar testemunho pelo que é e ser fiel a Deus por suas promessas. Devemos acreditar com todo nosso coração o que Deus nosso Pai nos prometeu.”
A Search for Solitude, Thomas Merton

17 novembro 2008

Decisões políticas e o bem

“ É verdade, os problemas políticos não são resolvidos por meio de amor e misericórdia. Mas o mundo da política não é o único mundo, e as decisões políticas só podem fazer um verdadeiro bem se forem baseadas em um alicerce feito de algo melhor e mais elevado do que a política. Quando um país tem de ser reconstruído após uma guerra, as paixões e energias da guerra não mais são suficientes. Tem de haver uma força nova, o poder do amor, o poder da compreensão e da compaixão humanas, a força do altruísmo e da cooperação, como o dinamismo criativo da vontade de viver e de construir, e vontade de perdoar, desejo de reconciliação.”

Honorable Reader: Reflections on My Work, de Thomas Merton
Editado por Robert E. Daggy
(Crossroad, Nova York) 1989, p. 125
Reflexão da semana de 17-11-2008

Um pensamento para reflexão: “Uma vida egoísta não pode ser fecunda. Não pode ser verdadeira; está em contradição com a natureza mesma da [espécie humana].”
Honorable Reader, Thomas Merton

10 novembro 2008

A contemplação não pode ser ensinada

“A contemplação não pode ser ensinada. Nem sequer pode ser claramente explicada. Só pode ser aludida, sugerida, apontada, simbolizada. Quanto mais objetiva e cientificamente se tentar analisá-la, mais ela será esvaziada do seu real conteúdo, pois essa experiência está fora do alcance da verbalização e da racionalização. Nada é mais repulsivo do que uma definição pseudo-científica da experiência contemplativa. Uma razão para isso é que os que tentam dar esse tipo de definição são tentados a proceder psicologicamente, e não há uma psicologia da contemplação que seja realmente adequada. Descrever ‘reações’ e ‘sentimentos’ é situar a contemplação onde ela não pode ser encontrada: na consciência superficial onde pode ser observada pela reflexão. Mas essa reflexão e essa consciência fazem precisamente parte desse eu externo que ‘morre’ e é posto de lado como uma roupa suja no verdadeiro despertar da contemplação.”

New Seeds of Contemplation
, de Thomas Merton
(New Directions, New York), 1962. p. 6-7
No Brasil: Novas sementes de contemplação (Editora Fissus, Rio de Janeiro). 2001. p.15
Reflexão da semana de 10-11-2008

Um pensamento para reflexão: “A única maneira de livrar-se das concepções equivocadas a respeito da contemplação é vivenciá-la.”
Novas Sementes de Contemplação, Thomas Merton

03 novembro 2008

Mais sagaz e menos sábio

“ As pessoas exigem que o governo não ‘interfira’ em nada, apenas dê dinheiro à indústria de armamento e trace uma forte política para a ‘segurança’. Mas que fique fora de todo o resto! Que não interfira na medicina, na saúde mental, na educação, etc. Nunca um país foi ao mesmo tempo mais sagaz e menos sábio – sagaz no não-essencial e lunático no essencial.

Não tenho dúvida de que o mundo se sente em relação aos EUA assim como muitos monges se sentem para com um abade que quer exercer poder total, receber obediência sem questionamento com base em slogans a cujo respeito ele mesmo parou de pensar cerca de 25 anos antes, e que, acima de tudo, quer ser amado, de tal forma que nunca, em momento algum ele pareça, a seus próprios olhos, estar exercendo poder, ou amando o poder. Ninguém lhe recusa o poder que tem: poucos lhe dão o amor que ele necessita para ficar seguro e contente. E, portanto, ele usa seu poder, de quando em quando, de formas imprevisíveis, arbitrárias e absurdas defendendo assim seus próprios fins e tornando todos infelizes.”

Turning Toward the World
, de Thomas Merton
Editado por Victor A. Kramer
(HarperSanFrancisco, São Francisco) 1996, p. 259
Reflexão da semana de 03-11-2008

Um pensamento para reflexão: “O absurdo da propaganda da defesa civil americana – pôr um abrigo no porão – que diz ‘saia em duas semanas e retome o estilo de vida americano’. A vida continua inexoravelmente em direção à crise e ao mistério. Todos devem lugar para adaptar-se a isso, para enfrentar a situação, para o ‘agora é o julgamento do mundo’”.
Turning Toward the World, Thomas Merton

27 outubro 2008

Deve-se manter a esperança

“ Temo a ignorância e o poder dos Estados Unidos. E o fato de que subitamente se tenha tornado uma das sociedades mais decadentes da face da Terra. O corpo de uma criança enorme, morta, açucarada. Contudo, não morta: cheia de um poder imenso, descontrolado. Louca.

Se alguém não entender os Estados Unidos sem demora - e comunicar algo desse entendimento aos Estados Unidos - os resultados serão terríveis. Não foi por acaso que os Estados Unidos dotaram o mundo da Bomba.

Uma mescla de imaturidade, tamanho, indulgência e depravação manifestas, com ocasionais espasmos de culpa, poder, ódio por si mesmos, beligerância, alternância de ferocidade e apatia, hiper-excitação e insanidade, inarticulação e desejo de ser popular. Você precisa de um médico, Tio Sam!

Turning Toward the World, de Thomas Merton
Editado por Victor A. Kramer
(HarperSanFrancisco, São Francisco) 1996, p. 60-61
Reflexão da semana de 27-10-2008

Um pensamento para reflexão: “Por que sou tão propenso a acreditar que o país será destruído? Sem dúvida é possível, e, em certo sentido, pode até ser provável. Mas se trata de um caso em que, apesar das evidências, deve-se manter a esperança. Não se deve sucumbir ao derrotismo e ao desespero, assim como se deve ter esperança de viver mesmo com uma doença mortal que tenha sido declarada incurável.”
Turning Toward the World, Thomas Merton

20 outubro 2008

Oculto mas Vivo

“ A contemplação […] é a própria vida plenamente despertada, plenamente ativa, plenamente consciente de que está viva. É um prodígio espiritual, uma admiração. Um temor espontâneo, reverencial, diante do caráter sagrado da vida, do ser. É gratidão pelo Dom da vida, pela consciência despertada, pelo ser. É a consciência viva do fato de que, em nós, a vida e o ser procedem de uma Fonte invisível, transcendente e infinitamente abundante. A contemplação é, acima de tudo, a consciência da realidade dessa Fonte. Ela conhece a Fonte, obscuramente, de modo inexplicável, mas com uma certeza que vai além, tanto da razão como da simples fé. […] É fé em maior profundidade, conhecimento demasiadamente penetrante para poder ser captado em imagens, palavras ou mesmo conceitos claros. […]

A contemplação é também a resposta a um chamado. Um chamado daquele que não tem voz e no entanto se faz ouvir em tudo que existe, e que, sobretudo, fala nas profundezas de nosso próprio ser, pois nós somos palavras dele. Mas somos palavras que existem para responder a Ele, atendê-lo, fazer-lhe eco e mesmo, de certo modo, para estarem repletas dele, contê-lo e significá-lo. A contemplação é esse eco. É uma profunda ressonância no mais íntimo centro de nosso espírito, onde nossa própria vida perde sua voz específica e ecoa a majestade e a misericórdia daquele que é oculto mas Vivo.


New Seeds of Contemplation, de Thomas Merton
(New Directions, New York), 1962. p. 1-3

No Brasil: Novas sementes de contemplação (Editora Fissus, Rio de Janeiro). 2001. p.9 e 11
Reflexão da semana de 20-10-2008

Um pensamento para reflexão: “Por isso a contemplação é mais do que mero considerar de verdades abstratas sobre Deus; mais até, do que a meditação afetiva das coisas em que cremos. É um despertar, uma iluminação, e a apreensão intuitiva, espantosa, com que o amor se certifica da intervenção criadora e dinâmica de Deus em nossa vida cotidiana.”
Novas sementes de contemplação, Thomas Merton

13 outubro 2008

Meu próprio caminho e o público

“ Não me considero integrado à sociedade belicosa em que vivo, mas o problema é que essa sociedade me considera integrado a ela. Observo que, há quase vinte anos, minha sociedade - ou os que nela lêem meus livros – decidiu uma identidade para mim, e insiste em que eu continue a corresponder perfeitamente à idéia de minha pessoa que eles encontraram ao ler meu primeiro livro de sucesso [A Montanha dos Sete Patamares, sua autobiografia, publicada em 1948]. Simultaneamente, contudo, as mesmas pessoas prescrevem para mim uma identidade contrária. Exigem que eu continue sendo para sempre o jovem monge superficialmente piedoso, bastante rígido e com uma mentalidade um tanto estreita que eu era vinte anos atrás e, ao mesmo tempo, fazem circular continuamente rumores de que saí do meu mosteiro. O que de fato aconteceu foi apenas que tenho vivido onde estou e desenvolvido meu próprio caminho sem consultar o público a esse respeito, pois isso não é da conta do público.”

Raids on the Unspeakable, de Thomas Merton
(New Directions Press, New York), 1964, p. 172
Reflexão da semana de 13-10-2008

Um pensamento para reflexão
: “Estou convencido de que as páginas deste diário me mostram como sou: ruidoso, cheio da algazarra de imperfeições e paixões, e das feridas abertas deixadas pelo pecado, cheio de defeitos, invejas e tormentos, cheio de meu próprio vazio intolerável.
Entering the Silence, Thomas Merton

06 outubro 2008

Irrelevância

“ Monges, hippies e poetas são importantes? Não, decididamente não temos qualquer importância. Vivemos com a inerente irrelevância, própria do ser humano. O homem marginal aceita a irrelevância básica da condição humana, irrelevância que se manifesta, sobretudo, no fato da morte. A pessoa marginal, o monge, o excluído, o prisioneiro, todos esses vivem na presença da morte; […] e a missão do monge ou da pessoa marginal; da pessoa meditativa ou do poeta é ultrapassar a morte mesmo nesta vida, ultrapassar a dicotomia da vida e da morte e ser, portanto, testemunha da vida.”

The Asian Journal of Thomas Merton
(New Directions Publishing Corp. New York), 1975 p. 305
No Brasil: O Diário da Ásia de Thomas Merton, (Ed. Vega, Belo Horizonte), 1978, p.241
Reflexão da semana de 06-10-2008

Um pensamento para reflexão: “Hoje [outubro de 1968] verificamos de maneira muito aguda, na América, que, essencialmente, o monge não se enquadra dentro de nenhuma instituição. Ele não faz parte de um ‘establishment’. Ele é uma pessoa marginal que deliberadamente se afasta para a margem da sociedade com a intenção de aprofundar a experiência fundamental do homem.”
O Diário da Ásia de Thomas Merton

29 setembro 2008

O brilho ilusório da novidade

“ Na moderna sociedade tecnológica, tornamo-nos insensíveis e desiludidos. Aprendemos a suspeitar do que se apresenta como novo, a duvidar da ‘última novidade’ em tudo. O novo atrai-nos instintivamente, mas nele só vemos a mesma velha impostura. O brilho ilusório da novidade, a pretensa criatividade de uma sociedade na qual a juventude é comercializada e os jovens são velhos antes dos vinte enche alguns corações de profundo desespero. Parece não haver meio de encontrar mudança real alguma. ‘Quanto mais as coisas mudam’, diz um provérbio francês, ‘mais são as mesmas’.

Entretanto, no mais profundo de nosso ser, ainda ouvimos a voz insistente que nos diz: ‘Você precisa renascer.’

Há em nós um instinto de novidade, de renovação, de liberação do poder criativo. Buscamos despertar em nós mesmos uma força que realmente mude nossas vidas de dentro para fora. Contudo, o mesmo instinto nos diz que essa mudança é a recuperação do mais profundo, mais original, mais pessoal que há em nós. Renascer não é tornar-nos outra pessoa, e sim tornar-nos nós mesmos.”

Love and Living, de Thomas Merton
Editado por Naomi Burton Stone e Patrick Hart, OCSO
(Farrar, Straus and Giroux, New York) 1979, p. 176
No Brasil: Amor e Vida, (Martins Fontes Editora, São Paulo), 2.004. p. 206

Reflexão da semana de 29-09-2008


Um pensamento para reflexão: “O instinto espiritual mais profundo do ser humano é o anseio pela verdade interior que exige que sejamos fiéis a nós mesmos: as nossas potencialidades mais profundas e mais originais. Ao mesmo tempo, contudo, para nos tornarmos nós mesmos, precisamos morrer. Ou seja, para descobrirmos nosso verdadeiro eu, o falso eu precisa morrer. Para que o eu interior apareça, o eu exterior precisa desaparecer, ou pelo menos tornar-se secundário, desimportante.
Amor e Vida, Thomas Merton

22 setembro 2008

Quer conhecer a Deus?

“ Quer conhecer a Deus? Aprenda a compreender as fraquezas e imperfeições dos [irmãos]. Mas como você pode compreender a fraqueza alheia se não entender a sua própria? Como pode ver o sentido de suas próprias limitações se não tiver recebido de Deus a misericórdia, que lhe dá o conhecimento de si mesmo e Dele? Não basta perdoar os outros: é preciso perdoar com humildade e compaixão. Perdoar sem humildade é um escárnio: supõe que somos melhores do que os outros.

No Man is an Island, de Thomas Merton
(Harcourt Brace Jovanovich, Publishers, New York), 1955. p. 163
No Brasil: Homem Algum é uma Ilha, (Verus Editora, Campinas), 2003. p. 183
Reflexão da semana de 22-09-2008

Um pensamento para reflexão
: “Vencemos o mal no mundo pela caridade e pela compaixão de Deus, e assim expulsamos todo mal do coração.”
Homem Algum é uma Ilha, Thomas Merton

15 setembro 2008

A verdadeira não-violência

“ A tática da não-violência é tática de amor que procura a salvação e a redenção do opositor, não seu castigo, sua humilhação e derrota. Uma pretensa não-violência que procura derrotar e humilhar o adversário por uma agressão espiritual em lugar de o atacar fisicamente é pouco mais do que a confissão de fraqueza. A verdadeira não-violência difere totalmente disso e é muito difícil. Esforça-se por operar sem ódio, sem hostilidade e sem rancor. Trabalha sem agressão, utilizando o lado bom que já pode encontrar no adversário. Pode ser fácil falar sobre isso em teoria. Na prática, não é fácil, especialmente quando o adversário está alertado em defesa amarga e violenta de uma injustiça e acredita ser justa sua atitude. Devemos assim ter cuidado com o modo pelo qual falamos de nossos opositores. Devemos ser ainda mais cuidadosos quanto à maneira como regulamos nossas desavenças com nossos colaboradores. É possível surgirem as mais amargas discussões, os ódios mais virulentos entre aqueles que devem trabalhar juntos em favor das mais nobres causas.

Conjectures of a Guilty Bystander, de Thomas Merton
(Doubleday, New York), 1966. p. 73-74
No Brasil: Reflexões de um espectador culpado, (Editora Vozes, Petrópolis), 1970. p. 100
Reflexão da semana de 15-09-2008

Um pensamento para reflexão: “Nada há nada mais próprio para arruinar e desacreditar um santo ideal do que uma guerra fratricida entre ‘santos’.”
Reflexões de um espectador culpado, Thomas Merton

08 setembro 2008

Simplicidade

“ Nada pode estragar esta manhã. A chuva parou. Os pássaros cantam e os estorninhos perseguem um curvo pelo céu cinza. As nuvens ainda estão baixas sobre o bosque. Faz frio.

Os barris de uísque estão de pé ou deitados na umidade ao lado do depósito de lenha, um deles com ervas molhadas até o meio, outros rolando nas lascas de madeira e pedaços de cascas de árvore encharcados.

Alguém serrou ao meio um barril pequeno, que agora é um dos objetos mais bonitos daqui. Um exemplo de wabi-sabi (simplicidade) de que Suzuki fala. Com alegria, ontem senti o cheiro de queimado desse barril. É lindo vê-lo apanhar chuva.”

A Search for Solitude, de Thomas Merton.
Editado por Lawrence S. Cunningham
(HarperSanFrancisco, San Francisco), 1996 p. 281

Reflexão da semana de 08-09-2008

Um pensamento para reflexão: “Um dia encantador depois do outro. Que paz! Meditação com vaga-lumes, bruma no vale, Lua minguante, corujas distantes – despertar interior gradual e centragem na paz e na harmonia de amor e gratidão.”
Dancing in the Water of Life, Thomas Merton

01 setembro 2008

O que é esse mundo?

“ Os cristãos agora estão se fazendo curiosas perguntas a respeito de algo chamado de “o mundo”. Deveriam insultá-lo como seus pais faziam? Devem renunciar a ele como os monges? Devem amá-lo como o próprio mundo se ama? Devem entrar em diálogo com ele, como o Papa dialoga com todo tipo de pessoas, sem excluir os russos? Ou, em longo prazo, devem admitir com franqueza que fazem parte do mundo e começar desse ponto? O que é esse mundo? Será que ele existe?

Devemos começar por admitir que o primeiro lugar no qual procurar o mundo não é fora, e sim dentro de nós mesmos. Nós somos o mundo. No mais profundo alicerce de nosso ser, permanecemos em contato metafísico com o todo da criação, da qual somos apenas pequenas partes. Por meio de nossos sentidos e de nossa mente, de nosso amor, necessidades e desejos, estamos envolvidos, sem possibilidade de evasão, neste mundo de matéria e de [seres humanos], de coisas e de pessoas, que não só nos afetam e mudam nossas vidas como também são afetados e modificados por nós. A partir do momento em que sentamos à mesa e colocamos um pedaço de pão na boca, vemos que estamos no mundo e não podemos estar em outro lugar a não ser nele até o dia de nossa morte. A questão, pois, não é especular a respeito de como vamos entrar em contato com o mundo – como se estivéssemos, por assim dizer, no espaço sideral -, mas como validar nossa relação, dar-lhe uma significação plenamente sincera e humana, e torná-la verdadeiramente produtiva e valiosa para o nosso mundo.”

Love and Living
, de Thomas Merton
Editado por Naomi Burton Stone e Patrick Hart, OCSO
(Farrar, Straus and Giroux, New York) 1979, p. 106
No Brasil: Amor e Vida, (Martins Fontes Editora, São Paulo), 2.004. p. 127
Reflexão da semana de 01-08-2008

Um pensamento para reflexão
: “É verdade que a maioria [dos seres humanos] se contenta em aceitar uma relação pré-fabricada que o próprio mundo lhes oferece, mas, em tese, todos somos livres para tomar distância do mundo, julgá-lo e até chegar a determinadas decisões a respeito de refazê-lo. Pelo menos podemos fazer isso no pequeno mundo do qual nos rodeamos em nossos próprios ninhos – nossos lares.”
Amor e Vida, Thomas Merton

25 agosto 2008

Esperando a Palavra de Deus em silêncio

“ Contemplação é, essencialmente, escutar em silêncio, uma expectativa… Em outras palavras, o verdadeiro contemplativo não é aquele que prepara sua mente para uma determinada mensagem que deseja ou espera ouvir mas sim, aquele que permanece vazio porque sabe que não pode esperar ou antever a palavra que irá transformar sua escuridão em luz. Não pode mesmo prever um tipo especial de transformação. Não requer luz ao invés de escuridão. Ele espera a Palavra de Deus em silêncio e quando obtém a ‘resposta’, não é tanto pelo irromper do mundo em seu silêncio. É pelo seu próprio silêncio repentina e inexplicavelmente revelando-se a si mesmo como uma palavra de grande força, plena da voz de Deus.”

Contemplative Prayer
, de Thomas Merton
(Doubleday & Company, Garden City, NY) 1969, p. 90
Reflexão da semana de 25-08-2008

Um pensamento para reflexão: “Nenhum escrito sobre as dimensões da meditação solitária da vida pode dizer algo que já não tenha sido dito pelo vento e pelos pinheiros.”
Honorable Reader, Thomas Merton

18 agosto 2008

A paz na insatisfação

“ Paradoxalmente, encontrei paz porque sempre estive insatisfeito. Meus momentos de depressão e desespero tornaram-se renovação, novos começos. Se eu tivesse me acomodado e ficado satisfeito com a superfície da vida, com suas divisões e clichês, melhor teria sido chamar logo um agente funerário… Assim, então, essa insatisfação que algumas vezes me preocupava e que certamente, bem sei, preocupava outros, ajudou-me, de fato, a mover-me livremente e até com alegria com o curso da vida. Meus protestos calados (ou falados) evitaram que me agarrasse a coisas já acabadas. Quando um pensamento termina, deixe que se vá. Quando algo foi escrito, publique-o, e vá em frente em busca de algo diferente. Você poderá dizer a mesma coisa novamente algum dia com maior profundidade. Ninguém deve se sentir compelido a ser total e perfeitamente ‘original’ em cada palavra que escreve.”

A Thomas Merton Reader, editado por Thomas P. McDonnell
(Image Books, A Division of Doubleday @ Company, Inc. Garden City, NY), 1962 p. 16
Reflexão da semana de 18-08-2008

Um pensamento para reflexão: “Tudo que importa é que o antigo seja recuperado num novo plano e transforme, a si mesmo, numa nova realidade. Isto também se afastará de você. Por isso deixe que se vá.”
A Thomas Merton Reader, Thomas Merton

11 agosto 2008

A salvação na solidão

“ [Em última análise, o que procuro na solidão não é felicidade nem realização, e sim salvação. Não a ‘minha própria salvação’, mas a salvação de todos. É aqui que a coisa fica séria. Já usei a palavra revolta ligada à solidão. Revolta contra o quê? Contra uma noção de salvação que é totalmente legalista e extrínseca e que pode ser conseguida por mais falsa, atrofiada e estéril que realmente seja a sua vida interior. Esta é a pior ambigüidade: a impressão de que se pode ser francamente desleal para com a vida, a experiência, o amor, as outras pessoas, o seu próprio eu mais profundo, e ainda assim ser ‘salvo’ por um ato de obstinado conformismo, pela vontade de ser correto. Afinal, isto me parece fatalmente semelhante ao ato pelo qual as pessoas se perdem: a determinação de estar ‘certo’ a qualquer preço, à força de endurecer o próprio centro em torno da escolha arbitrária de uma posição fixa. Fechar-se em seu erro central com a recusa de admitir que se possa estar errado... Estou aqui [na solidão e no eremitério] por uma razão: para estar aberto, não ‘fechado em’ alguma escolha, seja ela qual for, excluindo todas as outras: estar aberto à vontade de Deus e à liberdade do Seu amor, que vem me salvar de tudo aquilo que em mim Lhe resiste e diz não. Isto eu preciso fazer não para me justificar, não para estar certo, não para ser bom, mas porque todo o mundo de pessoas perdidas precisam desta abertura pela qual a salvação pode entrar através de mim.”

Learning to Love, de Thomas Merton
Editado por Christine M. Bochen
(HarperSanFrancisco, São Francisco) 1997, p. 345

Reflexão da semana de 11-08-2008


Um pensamento para reflexão: “As grandes razões para a solidão: as verdadeiras perspectivas – deixar o ‘mundo’ – até mesmo o mundo monástico com seus assuntos, vaidades, superficialidade. Cada vez mais vejo a necessidade de abandonar minha própria ‘carreira’ absurda como jornalista religioso. Parar de escrever para publicação - exceto poemas e meditações criativas.

Solidão – testemunho de Cristo – vazio.”

A Search for Solitude, Thomas Merton

04 agosto 2008

Para os que anseiam a verdadeira paz

[Trecho de uma carta a Jim Forest quando este participava de uma "greve pela paz" na Comissão de Energia Atômica, 29 de janeiro de 1962.]

“ Minha missa de 1º de fevereiro, festa de Santo Inácio de Antioquia*, mártir, será por todos os grevistas do mundo inteiro e por todos os que anseiam por uma verdadeira paz, todos os que estão dispostos a ajudar a carregar o grande fardo de trabalho, oração e sacrifício próprio pacientes pela paz . Nunca veremos seus resultados em nosso tempo, mesmo se conseguirmos atravessar os próximos cinco anos sem ser incinerados. Realmente temos de rezar por uma mudança total e profunda na mentalidade do mundo todo. O que no passado conhecíamos como penitência cristã será um conceito sem profundidade suficiente se não abranger os problemas e perigos especiais da era atual. As camisas de cilício não vão resolver a questão, embora não faça mal algum mortificar a carne. Porém, muitíssimo mais importantes são a conversão completa do coração e uma perspectiva totalmente nova sobre o mundo do homem.”
* Atualmente é celebrada em 17 de outubro.

The Hidden Ground of Love
, de Thomas Merton
Editado por William H Shannon
(Farrar, Straus & Giroux, New York), 1983. p. 262
Reflexão da semana 04-08-2008

Um pensamento para reflexão: “Temos de encarar o nosso dever em relação ao conjunto da humanidade. Não podemos deixar de cumprir esse dever que Deus está nos impondo com Sua própria mão.”
The Hidden Ground of Love, Thomas Merton

28 julho 2008

Criar nossas próprias vidas

“ Toda vida cristã destina-se a ser ao mesmo tempo profundamente contemplativa e rica em obra ativa. (…) É verdade que somos chamados a criar um mundo melhor. Mas somos chamados, antes de tudo, a uma tarefa mais imediata e elevada: a de criar nossas próprias vidas. Ao fazer isso, agimos como cooperadores de Deus. Assumimos nosso lugar na grande obra do gênero humano, pois, com efeito, a criação de nosso próprio destino em Deus é impossível em puro isolamento. Cada um de nós realiza o seu próprio destino em inseparável união com todos os outros com os quais Deus quis que vivêssemos. Partilhamos uns com os outros a obra criativa de viver no mundo. E é através de nossa luta com a realidade material, com a natureza, que nos ajudamos mutuamente a criar ao mesmo tempo nosso próprio destino e um mundo novo para os nossos descendentes. Essa obra do homem, que é a sua vocação peculiar e inescapável, é um prolongamento da obra criadora do próprio Deus. Deixar de enfrentar esse desafio e cumprir essa responsabilidade criadora é deixar de dar à vida a resposta que nos é solicitada pela vontade de nosso Pai e Criador.”

Love and Living, de Thomas Merton
Editado por Naomi Burton Stone e Patrick Hart, OCSO
(Farrar, Straus and Giroux, New York) 1979, p. 177
No Brasil: Amor e Vida, (Martins Fontes Editora, São Paulo), 2004. p. 186-187
Reflexão da semana de 28-07-2008

Um pensamento para reflexão: “Essa resposta ativa, essa fidelidade à vida mesma e a Deus que Se dá a nós através de nosso contato cotidiano com o mundo material, é o primeiro dever e o dever mais essencial do homem.”
Amor e Vida, Thomas Merton

21 julho 2008

Entender e amar as pessoas doentes

“ Estou convencido de que a sociedade afluente americana está doente. Afirmar essa doença como ‘valor secular’ é algo que absolutamente me recuso a fazer. O amor ‘do mundo’ neste caso significa entender e amar milhões de pessoas acometidas da doença e que sofrem por ela de várias maneiras; compaixão para com elas, desejo de libertá-las de suas obsessões (como alguém pode fazer isso? Estamos todos contagiados), dar-lhes algo de sanidade e autenticidade.

O erro está em rejeitar os doentes e condená-los junto com a doença.”

Dancing in the Water of Life, de Thomas Merton.
Editado por Robert E. Daggy
(HarperSanFrancisco, San Francisco), 1997 p. 226

Reflexão da semana de 21-07-2008

Um pensamento para reflexão: A única forma certa: amar e servir ao homem do mundo moderno, mas não simplesmente sucumbir, com ele, a todas as ilusões a respeito do mundo.
Dancing in the Water of Life, Thomas Merton

15 julho 2008

Árvores


Meu zen está no lento balanço dos altos pinheiros.

Longa e delgada coluna de uma árvore oscila seus mais de cem metros em arco mais amplo que todas as outras e baila mesmo quando todas estão quietas.

Centenas de olmos brotam do seco solo sob os pinheiros.

Meu relógio entre folhas de carvalho. Minha camiseta no alambrado e o vento canta no bosque nu.

A Search for Solitude, de Thomas Merton.
Editado por Lawrence S. Cunningham
(HarperSanFrancisco, San Francisco), 1996 p. 232
Reflexão da semana de 14-07-2008

Um pensamento para reflexão:
Doce tarde! Brisas frescas e céu claro!
Este dia não retornará.
Os touros sob as árvores no canto de seu campo.
Quieta tarde! Colinas azuis, lírios do dia ao vento. Este dia não retornará.
Turning Toward the World, Thomas Merton.


My zen is in the slow swinging tops of sixteen pine trees.
One long thin pole of a tree fifty feet high swings in a wider arc than all the others and swings even when they are still.
Hundreds of little elms springing up out of the dry ground under the pines.
My watch among oak leaves. My T-shirt on the barbed wire fence and the wind sings in the bare wood.

Thought for the Day:
Sweet afternoon! Cool breezes and a clear sky!
This day will not come again.
The bulls lie under the tree in the corner of their field.
Quiet afternoon! The blue hills, the day lilies in the wind. This day will not come again.

07 julho 2008

Nosso eu oculto e escuro

“ O problema básico e mais fundamental da vida espiritual é a aceitação do nosso eu oculto e escuro, com o qual tendemos a identificar todo o mal que está em nós. Devemos aprender a distinguir, por discernimento, o mato mau das nossas ações do solo bom da alma. E devemos preparar esse solo para que uma nova vida possa dele crescer dentro de nós, para além do nosso conhecimento e do nosso controle consciente. A atitude sagrada costuma ser de reverência, profundo respeito e silêncio diante do mistério que começa a ocorrer em nós quando tomamos consciência do nosso eu mais interior. Em silêncio, esperança, expectativa e não-saber, o homem de fé entrega-se à divina vontade: não como se fosse um poder arbitrário e mágico cujos decretos devessem ser decifrados, mas como ao próprio fluir da realidade e da vida.”

The Inner Experience, de Thomas Merton
Editado por William H. Shannon
(HarperSanFrancisco, San Francisco) 2003, p. 55.
No Brasil: A Experiência Interior, (Martins Fontes Editora, São Paulo), 2007. p. 78-79
Reflexão da semana de 07-07-2008

Um pensamento para reflexão
: “Portanto, a atitude sagrada é um respeito profundo e fundamental para com o real, seja qual for a forma em que ele se apresente.”
A Experiência Interior, Thomas Merton

30 junho 2008

A busca da unidade

“ É fato bem conhecido que, no Oriente, na China, na Índia, no Japão e na Indonésia, a vida religiosa e contemplativa é promovida há séculos e conheceu um desenvolvimento de uma riqueza ímpar. Durante séculos, a Ásia foi um continente de grandes comunidades monásticas. Ao mesmo tempo, a vida solitária floresceu ou à sombra dos mosteiros ou em florestas, montanhas ou desertos. O yoga hindu, em suas várias formas, tornou-se quase lendário em termos de contemplação oriental. O yoga recorre a uma variedade de disciplinas e técnicas ascéticas para a ‘libertação’ do espírito humano das limitações que lhe impõe a existência material, corpórea. Em todo o Oriente, seja no hinduísmo ou no budismo, encontramos essa sede profunda, indizível, de beber nos rios do Paraíso. Sejam quais forem as filosofias e teologias por trás dessas formas de existência contemplativas, o esforço é sempre o mesmo: a busca da unidade, o retorno para o eu mais interior unido com o Absoluto, a busca Daquele que está acima de tudo, e em tudo, Daquele que Só Ele é Só.”

The Inner Experience
, de Thomas Merton
Editado por William H. Shannon
(HarperSanFrancisco, San Francisco) 2003, p. 29-30
No Brasil: A Experiência Interior, (Martins Fontes Editora, São Paulo), 2007. p. 43-44

Reflexão da semana de 30-06-2008

Um pensamento para reflexão: “A oração é liberdade e afirmação crescendo a partir do nada em direção ao amor. A oração é o florescimento da nossa liberdade mais interior em resposta à Palavra de Deus.”
Contemplação num mundo de ação, Thomas Merton

23 junho 2008

Se não há silêncio, não há religião

“ Se não há silêncio para além e dentro de palavras de doutrina, não há religião, apenas ideologia religiosa. Isto porque a religião vai além das palavras e ações, e atinge a verdade última no silêncio. Quando falta esse silêncio, onde existem apenas as ‘muitas palavras’ e não A Palavra há muito alvoroço e atividade, mas nenhuma paz, nenhum pensamento profundo, nenhuma compreensão, nenhuma quietude interior. Quando não há paz, não há luz. A mente hiperativa tem a impressão de ser desperta e produtiva, mas isto é um sonho. Apenas no silêncio e na solidão, na quietude da adoração, na reverente paz da oração, a adoração na qual todo o ego silencia e se humilha na presença do Deus Invisível, só nessas ‘atividades’ que são ‘não-ações’ o espírito realmente desperta do sonho de uma existência dividida e confusa.”

Honorable Reader: Reflections on My Work, de Thomas Merton
Editado por Robert E. Daggy
(Crossroad, Nova York) 1989, p. 115

Reflexão da semana de 23-06-2008

Um pensamento para reflexão: “Quem quer uma vida espiritual, precisa unificar a própria vida. Uma vida é ou toda ou nada espiritual. Ninguém pode servir a dois senhores. A sua vida é plasmada pela finalidade para a qual você vive. Você é feito à imagem daquilo que deseja.”
Na liberdade da solidão, Thomas Merton.

16 junho 2008

O silêncio do mundo e o nosso barulho

“ Os que amam o ruído que fazem são impacientes com o resto. Desafiam constantemente o silêncio das florestas, das montanhas e do mar. Passeiam com suas máquinas pela floresta silenciosa, em todas as direções, cheios de medo de que um mundo calmo os acuse de vazios. A pressa da sua velocidade, a pretexto de um fim, simula ignorar a tranqüilidade da natureza. O avião ruidoso, por sua trajetória, por seu estrondo, por sua força aparente, por um momento parece negar a realidade das nuvens e do céu. Vai-se o avião, fica o silêncio do céu. Afasta-se ele, a tranqüilidade das nuvens permanece. O silêncio do mundo é que é real. O nosso barulho, os nossos negócios, os nosso planos e todas as nossas fátuas explicações sobre o nosso barulho, negócios e planos, tudo isso é ilusão.”

No Man is an Island, de Thomas Merton
(Harcourt Brace Jovanovich, Publishers, New York), 1955. p. 257
No Brasil: Homem algum é uma ilha, (Verus Editora, Campinas), 2003. p. 216
Reflexão da semana de 16-06-2008

Um pensamento para reflexão: “Não é o falar que rompe nosso silêncio, mas a ansiedade de ser ouvido. As palavras do orgulhoso impõem silêncio aos demais, de maneira que só ele possa ser ouvido. O humilde nada pede senão uma esmola; depois, espera e escuta.”
Na liberdade da solidão, Thomas Merton

09 junho 2008

Ouvir as palavras em silêncio

“ A mensagem da misericórdia de Deus para com o homem deve ser anunciada. A palavra da Verdade tem de ser proclamada. Isso não pode ser negado. Entretanto, não são poucos os que começam a sentir a inutilidade de acrescentar mais palavras ainda à continua maré que se derrama, sem sentido, sobre todos, em toda parte, da manhã à noite. Para que a linguagem possa ter sentido, é necessário que haja, em algum lugar, intervalos de silêncio para separar uma palavra da outra, um pronunciamento do outro. Quem se retira em busca de silêncio não necessariamente odeia a palavra. Talvez sejam o amor e o respeito pela linguagem humana que lhe impõem silêncio. Pois a misericórdia de Deus só é ouvida em palavras se for ouvida - tanto antes como depois de pronunciadas as palavras — em silêncio.”

Disputed Questions, de Thomas Merton
(Harcourt Brace Jovanovich, Publishers, New York), 1960. p. 195
No Brasil: Questões abertas, (AGIR, Rio de Janeiro), 1963. p. 217
Reflexão da semana de 09-06-2008

Um pensamento para reflexão: “Que eu procure, pois, o dom do silêncio, da pobreza e da solidão, onde tudo que toco se transforma em oração; onde o céu é minha oração, os pássaros são minha oração, o vento nas árvores é minha oração, pois Deus é tudo em tudo.”
Na liberdade da solidão, Thomas Merton

02 junho 2008

Para que o homem se faça Deus

“ O que agora se necessita não é apenas o cristão que se compraz internamente com as palavras e o exemplo de Cristo, mas aquele que segue Cristo de forma perfeita, não só em sua vida pessoal, não só na oração e na penitência, mas também em seus compromissos políticos e em todas as responsabilidades sociais. Certamente não precisamos de uma espiritualidade pseudo-contemplativa que afirma ignorar por completo o mundo e seus problemas e supostamente se dedica às coisas de Deus, sem se preocupar com a sociedade humana. Toda verdadeira espiritualidade cristã, mesmo a do cristão contemplativo, é e sempre deve ser profundamente preocupada com o ser humano, pois ‘Deus se fez homem para que o homem se faça Deus’ (S. Irineu). O espírito cristão é de compaixão, responsabilidade e compromisso. Não pode ser indiferente ao sofrimento, à injustiça, ao erro e à inverdade.”

Peace in the Post-Christian Era
, Thomas Merton
Editado por Patricia A. Burton
(Orbis Books, Maryknoll, NY), 2004, p. 135
No Brasil: A paz na era pós-cristã, (Editora Santuário, Aparecida do Norte), 2008, p.
Reflexão da semana de 02-06-2008

Um pensamento para reflexão: “Vivemos à beira do desastre porque não sabemos como deixar a vida acontecer. Não respeitamos as contradições e paradoxos vivos e fecundos de que a verdadeira vida está cheia. Nós os destruímos, ou tentamos destruí-los, com nossas sistematizações obsessivas e absurdas. Quer o façamos em nome da matéria ou em nome do espírito, faz pouca diferença no final. Existem ateus que lutam contra Deus e ateus que afirmam acreditar Nele: o que ambos têm em comum é o ódio à vida, o medo da imprevisibilidade, o horror à graça e a recusa de todo dom espiritual.”
A Thomas Merton Reader, editado por Thomas P. McDonnell

26 maio 2008

Amor: o alicerce mais profundo do meu ser!

“ Será que realmente renunciamos a nós mesmos e ao mundo para encontrar Cristo? Ou renunciamos ao nosso eu falso e alienado para escolher nossa verdade mais profunda ao escolher o mundo e Cristo ao mesmo tempo? Se o alicerce mais profundo do meu ser é amor, então nesse próprio amor, e em nenhum outro lugar, encontrarei a mim mesmo, ao mundo e a meu irmão e irmã em Cristo. Não é uma questão de ‘isto ou aquilo’, mas de tudo em um. Não é uma questão de exclusividade e ‘pureza’, mas de integridade, inteireza, unidade e da gleichheit (igualdade) de Mestre Eckhart, que encontra o mesmo fundamento de amor em tudo.”

Contemplation in a World of Action, de Thomas Merton
(Doubleday & Co., Garden City, NY), 1973. p. 171
No Brasil: Contemplação num mundo de ação, (Ed. Vozes, Petrópolis), 1975. p. 154-155
Reflexão da semana de 26-05-2008

Um pensamento para reflexão: “A Bíblia é um livro ‘mundano’ no sentido de que vê Deus no próprio centro da vida e do trabalho humanos, das relações dos homens com os outros homens, sua diversão e sua alegria.”
Que livro é esse?, Thomas Merton

19 maio 2008

Confronto entre o mundo e Cristo?

“ Persiste uma profunda sabedoria na abordagem cristã tradicional do mundo como objeto de escolha. Mas temos de admitir que as compulsões habituais e mecânicas de certo tipo limitado de pensamento cristão falsificaram a verdadeira perspectiva de valores em que o mundo pode ser descoberto e escolhido tal como é. Tratar o mundo apenas como uma aglomeração de bens e objetos materiais externos a nós, e rejeitar esses bens e objetos no intuito de buscar outros que sejam ‘interiores’ e ‘espirituais’ é, na verdade, deixar escapar todo o sentido do desafio que é o confronto entre o mundo e Cristo. Escolhemos mesmo entre o mundo e Cristo, como entre duas realidades conflitantes, absolutamente opostas? Ou optamos por Cristo escolhendo o mundo tal como é nele, isto é, criado e redimido por Ele e encontrado no alicerce da nossa liberdade pessoal e o do nosso amor?”

Contemplation in a World of Action, de Thomas Merton
(Doubleday & Co., Garden City, NY), 1973. p. 170-171
No Brasil: Contemplação num mundo de ação, (Editora Vozes, Petrópolis), 1975. p. 154
Reflexão da semana de 19-05-2008

Um pensamento para reflexão: “O mundo não pode ser um problema para alguém que vê como, afinal, Cristo, o mundo, sua irmã, seu irmão e seu próprio e mais íntimo alicerce tornam-se uma unidade na graça e no amor redentor. Se toda a conversa atual sobre o mundo ajudar as pessoas a descobrirem esta realidade, muito bem. Mas se não gerar mais do que um novo divisor de água de posições obrigatórias e ‘respostas contemporâneas’, seria melhor esquece-las.”
Contemplação num mundo de ação, Thomas Merton

12 maio 2008

O mundo e o íntimo de nosso ser

“ A maneira de encontrar o verdadeiro ‘mundo’ não está em apenas observar e medir o que se acha fora de nós, mas sim em descobrir o íntimo de nosso ser. Pois é aí que se encontra o mundo em primeiro lugar: no meu mais profundo eu. Mas acontece que descubro ali que o mundo é bem diferente das ‘respostas obrigatórias’. Esse ‘terreno’, esse ‘mundo’ onde estou misteriosamente presente ao mesmo tempo ao meu próprio eu e às liberdades de todos os homens, não é uma estrutura visível, objetiva e determinada com leis e exigências fixas . É um mistério vivo que cria a si mesmo do qual eu mesmo sou uma parte, e para o qual sou a única porta de acesso. Quando encontro o mundo no meu próprio terreno, é impossível ser alienado por ele. São precisamente as respostas obrigatórias que insistem em mostrar o mundo como totalmente outro que eu e meu próximo, que me alienam de mim mesmo e do meu próximo. Assim, não vejo razão para nossa compulsão de fabricar conjuntos cada vez mais novos e reluzentes de respostas obrigatórias.”

Contemplation in a World of Action, de Thomas Merton
(Doubleday & Co., Garden City, NY), 1973. p. 170
No Brasil: Contemplação num mundo de ação, (Editora Vozes, Petrópolis), 1975. p. 154

Reflexão da semana de 12-05-2008

Um pensamento para reflexão: “As verdadeiras soluções não são as que aplicamos à força à vida conforme nossas teorias, mas as que a própria vida fornece aos que se dispõem a acolher a verdade. Por conseguinte, cabe-nos dissociar-nos de todos os que têm teorias que prometem soluções nítidas e infalíveis, e desconfiar de todas essas teorias, não com um espírito negativista e derrotista, e sim confiando na própria vida, na natureza, e, permitam-me dizer, em Deus acima de tudo.”
Raids on the Unspeakable, Thomas Merton

05 maio 2008

Integração ao mistério de Cristo

“ Só começamos a entender a importância concreta não apenas de nossos sucessos, mas também dos fracassos e acidentes de nossas vidas quando nos vemos em nosso verdadeiro contexto humano, como membros de uma espécie destinada a ser um organismo e ‘um corpo’. Meus sucessos não são meus próprios. O caminho que levou a eles foi preparado por outros. O fruto de meus esforços não é meu próprio: estou preparando o caminho para as realizações de outro. Meus fracassos também não são meus próprios. Podem provir da falha de outro, mas também são compensados pela realização de outro. Portanto, o significado da minha vida não deve ser procurado apenas na soma totais de minhas realizações. Só é visto na completa integração de minhas realizações e falhas às realizações e falhas de minha própria geração e sociedade e tempo. É visto, acima de tudo, em minha integração ao mistério de Cristo.”

No Man is an Island, de Thomas Merton
(Harcourt Brace Jovanovich, Publishers, New York), 1955. p. 16
No Brasil: Homem algum é uma ilha, (Verus Editora, Campinas), 2003. p. 17

Reflexão da semana de 05-05-2008

Um pensamento para reflexão: “Na verdade, o mundo não tem termos próprios. Não dita termos ao homem. Nós e nosso mundo nos interpenetramos. Se podemos dizer alguma coisa, é que o mundo existe para nós, e nós existimos para nós mesmos. Só assumindo pela responsabilidade por nosso mundo, por nossas vidas e por nós mesmos podemos dizer que vivemos realmente para Deus.”
Homem algum é uma ilha, Thomas Merton

28 abril 2008

Escolher o mundo

“ Eu não tive escolha em relação à época em que viveria, mas posso, contudo, escolher minha atitude, bem como a maneira e a proporção como vou participar dos acontecimentos vivos que nela se desenrolam. Escolher o mundo não é, portanto, apenas a admissão piedosa de que o mundo é aceitável porque vem das mãos de Deus. Trata-se, em primeiro lugar, da aceitação de uma tarefa e de uma vocação no mundo, na história e no tempo. No meu tempo, que é o presente. Escolher o mundo é escolher fazer o trabalho de que sou capaz, em colaboração com meu irmão e minha irmã, para tornar o mundo melhor, mais livre, mais justo, mais habitável, mais humano. E agora se tornou totalmente óbvio que a mera "rejeição automática do mundo" e "desprezo pelo mundo" não é, na verdade, uma escolha, mas uma fuga da escolha. A pessoa que pretende poder dar as costas a Auschwitz ou ao Vietnã e age como se eles não existissem, está simplesmente blefando.”

Contemplation in a World of Action, de Thomas Merton
(Doubleday & Co., Garden City, NY), 1973. p. 164 - 165
No Brasil: Contemplação num mundo de ação, (Editora Vozes, Petrópolis), 1975. p. 149
Reflexão da semana de 28-04-2008

Um pensamento para reflexão
: “O grande problema do nosso tempo não é formular respostas claras para questões teóricas bem definidas, mas enfrentar a alienação auto-destrutiva do homem em uma sociedade dedicada, em tese, a valores humanos e, na prática, à busca do poder pelo poder.”
Contemplação num mundo de ação, Thomas Merton

21 abril 2008

Incêndio na floresta

“ Cada vez aprecio mais a beleza e a solenidade do ‘Caminho’ que sobe por entre os bosques, passa pelo estábulo do touro, galga a encosta pedregosa, entra no meio dos altos e eretos carvalhos e nogueiras e, dando a volta pelos pinheiros no alto da colina, chega até o chalé.

Nascer do sol. Oculto por pinheiros e cedros no lado leste da casa. Vi a chama vermelha de seu resplendor através dos cedros não como a alvorada, mas como um incêndio na floresta. Da janela do cômodo da frente, ele, o Sol (é difícil deixar de imaginá-lo como um ‘ele’), brilhou em silêncio com solene força através dos galhos de pinheiro.

Agora, após a Missa Solene, todo o vale está glorioso com a luz matinal e o canto dos pássaros.

É essencial vivenciar todos os tempos e estados de ânimo deste lugar.
Ninguém saberá ou conseguirá dizer quão essencial. Quase o primeiro e mais importante elemento de uma vida verdadeiramente espiritual, perdida na rotina constante e formal dos Ofícios Divinos sob as lâmpadas fluorescentes do coro – praticamente sem diferença entre noite e dia.”

Turning Toward the World
, de Thomas Merton
Editado por Victor A. Kramer
(HarperSanFrancisco, São Francisco) 1997, p. 122
Reflexão da semana de 21-04-2008

Um pensamento para reflexão
: “Muitos, sem dúvida, têm uma vaga consciência da alvorada, mas estão protegidos contra sua solenidade pelo culto neutralizador de sua própria sociedade, de seu próprio mundo no qual o sol já não nasce nem se põe.”
Turning Toward the World, Thomas Merton

14 abril 2008

Poder e misericórdia

“ O mistério do Bom Samaritano é, portanto, o mistério de chesed: poder e misericórdia. Afinal, é o próprio Cristo que jaz ferido à beira da estrada. É Cristo que vem na pessoa do samaritano. E Cristo é o laço, a compaixão e a compreensão entre os dois. Assim é que a Igreja é construída de pedras vivas, unidas pela misericórdia. Ali onde existe, de um lado, um desamparado ferido e meio morto, e, do outro, um rejeitado sem prestígio, e um se inclina com piedade para ajudar o outro, opera-se uma epifania divina, um despertar. Aí há homem, aí a realidade se torna humana e, em resposta a esse movimento de compaixão, surge, na terra, uma Presença, e a brilhante nuvem da majestade de Deus cobre a pobreza e o amor de ambos. Pode não haver consolação nisso. Pode não haver nada de humanamente encantador. Não é necessariamente como no cinema. Talvez, exteriormente, o encontro seja sórdido e nada atraente. Mas a Presença de Deus na Terra aí se realiza, Cristo está ali e Deus está em comunhão com o homem.”

Seasons of Celebration, de Thomas Merton
(Farrar, Straus and Giroux, New York), 1965. p. 181-182
No Brasil: Tempo e Liturgia, (Editora Vozes, Petrópolis), 1968. p. 185-186

Reflexão da semana de 14-04-2008

Um pensamento para reflexão: “Chesed, misericórdia e poder, se manifesta visivelmente no chasid ou o santo. De fato, o santo é alguém cuja vida inteira está imersa na chesed de Deus. O santo é o instrumento da misericórdia divina. Através do chasid, o amor de Deus se estende no mundo, num mistério visível, um mistério de pobreza e amor, mansidão e poder.”
Tempo e Liturgia, Thomas Merton

07 abril 2008

O toque de um sino de catedral

“ A parábola do Bom Samaritano é uma revelação de Deus numa palavra que tem grande importância através de todas as Escrituras, do início ao fim. É uma revelação do que o profeta Oséias diz, falando pelo Deus invisível: ‘a misericórdia e não o sacrifício’. O que é essa misericórdia da qual se fala em toda parte nas Escrituras e especialmente nos Salmos? A Vulgata faz ouvir a palavra misericórdia como o toque profundo de um sino de catedral. Misericórdia é o burden* ou o ‘bourdon’, é o som baixo e em surdina de toda a Bíblia. Mas a palavra hebraica que traduzimos como misericórdia diz muito mais do que apenas misericórdia.

Chesed (misericórdia) é também fidelidade e fortaleza. É a misericórdia fiel e indefectível de Deus. É o fundamental, aquilo que não falha, porque é o poder que une uma pessoa a outra, numa aliança de vontades. É o poder que nos une a Deus, porque Ele nos prometeu a sua misericórdia e jamais falhará em sua promessa, porque Ele não pode falhar. É o poder e a misericórdia que mais o caracterizam, que mais se aproximam do mistério no qual penetramos quando todos os conceitos se obscurecem e nos escapam.”
* Burden (inglês) ou bourdon (francês) é em português bordão. Significa o som mais baixo em certos instrumentos; nome dado às cordas mais grossas de vários instrumentos. Em alemão Unterton.

Seasons of Celebration, de Thomas Merton
(Farrar, Straus and Giroux, New York), 1965. p. 175
No Brasil: Tempo e Liturgia, (Editora Vozes, Petrópolis), 1968. p. 179
Reflexão da semana de 07-04-2008

Um pensamento para reflexão: “Cada dia é uma nova aurora daquele lumen Christi, a luz de Cristo que não conhece o ocaso.”
Tempo e Liturgia, Thomas Merton

31 março 2008

'Chesed' roubou-nos tudo

“ Quem é meu próximo? A quem estou ligado? Quem devo amar?

Essas não são perguntas inteligentes e não têm respostas claras. Ao contrário, qualquer tentativa de respondê-las nos envolve em intermináveis sutilezas, coisas vagas e, em última instância, confusão. O amor desconhece classificações. A medida do amor estabelecida por Cristo para nós ultrapassa medidas: temos de ser ‘perfeitos como o Pai do céu é perfeito’. Mas o que significa a ‘perfeição’ do Pai celeste? É imparcialidade, não no sentido de uma justiça que tem igual medida para todos, conhecendo seus méritos, e sim no sentido da chesed, que desconhece classificação de bem e mal, justo e injusto. ‘Pois Ele faz cair a chuva sobre os justos e os injustos’.

Estamos ligados a Deus na chesed. O poder de sua misericórdia apossou-se de nós e não nos deixará: por isto, nos tornamos tolos. Não podemos mais amar com sabedoria. E porque nos despojamos nessa loucura que Ele nos enviou, podemos ser movidos por Sua imprevisível sabedoria de maneira que amamos a quem amamos e ajudamos a quem ajudamos, não conforme os nossos próprios planos, mas segundo a medida estabelecida por nós em Sua vontade oculta, que não conhece medida. Nessa loucura, que é obra do Seu Espírito, devemos amar especialmente os desamparados, que nada podem por nós. Temos também de receber seu amor, conscientes de nosso próprio desamparo e incapacidade de bastar-nos a nós mesmos. Chesed tornou-nos como que rejeitados e pecadores. Chesed inclui-nos entre os estrangeiros e os estranhos; chesed não só nos tirou nossa razão, mas também nos classificou no mesmo plano que todos os demais, aos olhos de Deus. Assim, não temos morada, nem família, nem nicho na sociedade e nenhuma função reconhecível. Nem tampouco damos a impressão de ser especialmente caridosos e não nos podemos orgulhar de nossa virtude. Chesed aparentemente roubou-nos tudo isso, pois aquele que vive apenas segundo a misericórdia de Deus, só por essa misericórdia pode viver e por nada mais. Plenitudo legis esta caritas. A caridade é a plenitude da lei.”

Seasons of Celebration, de Thomas Merton
(Farrar, Straus and Giroux, New York), 1965. p. 180-181
No Brasil: Tempo e Liturgia, (Editora Vozes, Petrópolis), 1968. p. 184-185

Reflexão da semana de 31-03-2008